sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Amar a Sabedoria


Hoje é o dia do Filósofo. Não sei especificamente o porque deste dia ser o dia do Filósofo, só descobri que é uma data aleatória. Mas, também não quero aqui e nem pretendo definir o que vem a ser filósofo ou ainda me colocar como um desbravador desse mundo maravilhoso que é o Filosofar, porém – como um amante do saber – sinto-me na obrigação de lembrar-me dessa experiência existencial-intelectual que posso ter com o Filosofar – não de forma sistemática, mas antes poética e dionisíaca, nas palavras de Nietzsche.  Como um filósofo, formado indiretamente por Jesuítas, terei que escolher três aspectos desse filosofar em minha história: o espanto, a solidão e a dança...
                A primeira experiência do filosofar é o espanto, isto é, o deparar-se e o sentir-se num encanto-apavoramento diante do mundo, de Deus, do humano... Em minha primeira experiência, diante do pensamento filosófico, o apavoramento tomou conta de meu ser: de um lado via a incrível capacidade de reflexão de tantos mestres com um temor inseguro e incapaz, de outro espantava de minha pouca capacidade perceptiva de tantas ideias e meditações. O espanto filosófico ainda nos dá a oportunidade de sairmos “da vista apenas de um ponto” e leva-nos a dar atenção ao insignificante tão significativo. Lembro-me aqui daquele principezinho inquieto de Exúpery em suas doces palavras: “Conheço um planeta onde há um sujeito vermelho, quase roxo. Nunca cheirou uma flor, nunca olhou uma estrela. Nunca amou ninguém. Nunca fez outra coisa senão contas. E o dia todo repete, como tu: ‘Eu sou um homem sério! Eu sou um homem sério!’”
                Quanto à Solidão, ouso afirmar que a mesma é uma obrigação histórica-epistemológica do filósofo. Quanto mais entramos na paixão pela sabedoria, mais nos aproximamos dessa solidão em meio à multidão. O filósofo é obrigado a perceber o mundo com olhos salientes, mas quanto mais partilha – pela basilar e frágil linguagem – tanto mais se sente sozinho em seu vislumbre da existência e do mundo que só pode ser pensado e não conhecido. Ao contrário do arrogante, o filósofo se percebe em sua ignorância, em sua inquietude e principalmente em seu problema para si mesmo (Sto. Agostinho).
                 Encerrando, posso falar da dança. Não interpretemos dança aqui de uma forma literal, mas antes como uma oportunidade de atentarmo-nos para a música da existência. O autêntico dançarino é aquele que antes de tudo percebe a música através de seus sentidos e só depois parte para a coreografia, inspirada pelo ritmo. Ao filosofarmos, percebemos os sons da história e em seguida podemos fazer de sua dança um ritmo ético-antropológico-estético, de cujo valor entenderemos na dança existencial e não simplesmente em teorias e livros. Poderia aqui citar, para talvez exemplificar ou ainda somente dançar, a frase célebre de Nietzsche: “Eu não quero ser um santo, eu prefiro ser um palhaço [...] Talvez, eu seja um palhaço.”
                Para não concluir, poderia dizer, parafraseando Merleau-Ponty, que a filosofia é reaprender no mundo; Tornamo-nos seres cada vez mais mundanos, sem preocupação com sermos dignos do céu ou não, mas antes de sermos mais humanos e éticos em nosso seres...



Jackson de Sousa Braga
Só, 16 de agosto de 2013
Dia do Filósofo.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Uma atitude diante da educação: processo hermenêutico da proposta educacional.




A educação está passando pela crise atual, devido a mudança de época[1] que se encontra a presente sociedade. Os pensadores e intelectuais são chamados a analisar o momento atual e suas presentes marcar, bem como apontar ideias de como o ser humano e a educação podem melhor se posicionar e educar nesta presente sociedade. Neste sentido, este texto, mesmo que a grosso modo, pretende apresentar algumas ideias sobre o problema da sociedade atual e apontar alguns caminhos propostos, que se acredita serem principais e importantes, para educação – ressaltando principalmente o papel do professor, seguido as linhas da seguinte frase: “A necessidade real é de uma nova atitude diante da educação, começando por um rompimento as tradicionais e ultrapassadas rotinas do ‘fazer pedagógico’”.
            A primeira posição que se pretende é um olhar para a atual mudança na sociedade presente. Conforme dito acima, a sociedade atual vive uma mudança de época e nela se insere a educação como caminho único para o sujeito humano se encontrar frente às novas propostas. Dois fatores se destacam nesta sociedade, a saber: o avanço das tecnologias e o processo de globalização.
            Quanto ao avanço da tecnologia[2], tem-se que destacar a dissolução do “novo”. Na sociedade atual, a todo momento é lançado algo novo e este se perde não imensidão das criações humanas e ainda se deixa perder de vista nas variadas propostas para a educação que sempre se propõe. Isto é, o ser humano está inventado a todo momento algo novo e este se deixa perder sempre, pois nunca é algo presente, mas algo passageiro e momentâneo. Além disso, as tecnologias, num sentido de inventos de objetos e coisas, estão fazendo com que o ser humano crie potência para a preservação da vida e também para disseminação da morte, salientado o paradoxo e a falta de valores e referências.
            Também o processo de globalização tem provocado também grandes consequências paradoxais à vida humana. Por um lado, o ser humano agora tem acesso à informação e conhecimento de forma fácil e rápida. Entretanto, por outro, o ser humano é incentivado pelo mercado que também se tornou globalizado a se tornar um consumista – não de educação, cultura e informação, mas de entretenimento e tecnologias (incluindo livros e objetos) que prometem trazer felicidade e realização de forma fácil e rápida a vida humana (Cf. PONDÉ, 2012, p. 133). Além disso, na sociedade atual se encontra diferentes épocas mentais de seres humanos, isto é, na sociedade atual não existe um padrão de geração, mas uma diversidade de pensamento geracional[3].
            Disto, já podemos concluir a mudança de época que se encontra na sociedade atual. Não é simplesmente uma sociedade que mantém suas metas, valores e costumes, com diferentes manifestações (época de mudanças), mas uma sociedade que assumiu novos valores, metas e costumes, valendo-se de tudo que a época anterior lhe ofereceu (tecnologia, informação etc.). A questão que se encontra vigente é como o professor e a educação vão atuar de forma efetiva nessa nova sociedade, cheia de culturas e valores diferentes?


            Tendo em vista a última pergunta e a reflexão de todo este texto pretende-se apontar algumas possíveis ideias, pensamentos e caminhos para não uma solução, mas uma provocação rumo ao progresso humano em relação à educação.
            Conforme é sabido, depois da Lei 9.394/96, a educação no Brasil tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, o preparo para o exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho (Cf. FERREIRA, 2008, p.78). Neste sentido, a primeira postura principal que se propõe ao professor é ter a capacidade de contextualizar e trazer para o cotidiano o conteúdo estudado. Esta missão não será fácil, pois, como vimos acima, o cotidiano do estudante tem se tornado um contexto mesclado de ideias, posturas e características cheias de constantes mudanças. Por isso, cabe ao professor entrar no mundo/contexto do aluno e assumi-lo[4] de forma positiva e aberta, apontando as contribuições que a formação educacional, intelectual, humana, política e cidadã podem trazer para sua vida e história.
            Neste sentido, surge a segunda postura que se acredita ser fundamental para o professor, a não-criação de novos métodos e sim o olhar para o passado com olhos críticos – assumindo as posturas corretas e superando as tradicionais e ultrapassadas rotinas do “fazer pedagógico”. Com a visão do contexto do aluno e a união do trabalho educacional (escolas, sociedade, família), pode-se sugerir um Projeto Político Pedagógico[5] e com este caminhar rumo a posturas apropriadas diante da educação. Conforme dito não são posturas novas ou novos modos de lidar com o aluno (conforme já percebemos o “novo” já é um modo falido de encarar a realidade), mas fazer um olhar crítico e bem embasado na visão de que se podem assumir as antigas posturas com uma contextualização hermenêutica.
            Finalmente, podemos propor a terceira postura que se acredita ser importante: a superação do tecnicismo educacional.  O professor assume a postura de transformar, ou melhor, transubstanciar[6] o currículo escolar tendo em vista o aluno, sua cultura e a efetivação no cotidiano do que é aprendido. Por isso, o professor deve superar a uniformidade de pensamento, as abordagens mecanicistas e a inabilidade para intervir criticamente no mundo da prática escolar (Cf. CRUICKSHANK e BRITZMAN apud FERREIRA, 2008, p. 96). Além disso, não se pode esquecer que cabe ao professor a constante atualização e disposição para a atualização de seus conhecimentos.
            Portanto, podemos concluir esse trabalho, apontando que não exaurimos todos os pensamentos e questões da postura e comportamentos dos professores para a educação, mas antes apresentamos algumas posturas que acreditamos serem importantes, principais e fundamentais para a educação do novo milênio. Agora, cabe a nós, educadores e futuros educadores, uma postura de fazer na realidade existencial a diferença cabível na história educacional contemporânea, sempre tendo em vista que não é momento de novas posturas, mas antes um olhar e atuação atentos, críticos e hermenêuticos para a transubstanciação educacional.
Referências Bibliográficas:
  • FERREIRA, Mecira Rosa. Currículos e Programas. Batatais: Centro Universitário Claretiano, 2008.
  • PONDÉ, Luiz Felipe. Guia Politicamente Incorreto da Filosofia. São Paulo: Leya, 2012.


[1] Uma atenção muito grande para a linguagem usada, não é um período de mudanças, mas uma mudança de época que nos encontramos. O momento atual está tirando os referenciais antigos e colocando novos, ou seja, as principais instituições da vida humana estão passando por uma grave crise e dentre elas se encontra a escola. (Cf. http://oecoambiental.blogspot.com.br/2009/10/artigo-frei-betto.html acesso dia 24/09/12 às 15h45min)
[2] Tecnologia aqui não se refere unicamente a inventos e materiais maquinários, mas antes ao sentido original da palvra: τέχνη – arte, num sentido de produzir algo, buscando conhecer-se no que se produz e λόγος – pensamento discurso. Portanto, Tecnologia aqui se refere a produção de algo pelo pensamento, como forma de arte que se refere ao que se é estudado. Não se deve assumir somente no sentido de objetos, mas também de propostas para algum momento da história, para alguma instituição. Aqui podemos dizer que também é tecnologia as novas propostas para a educação.
[3] Podemos encontra Jovens superconectados e pessoas sem nenhum conhecimento internaútico. Além disso, pessoas que acreditam que a fé (pensamento medieval) e/ou tecnologia (pensamento moderno) é o único caminho de salvação e outras que nem acreditam em uma salvação (pós-moderno/ contemporâneo).
[4] Não de forma total, pois deve-se manter ainda o limite e a postura de educador.
[5] Projeto Político Pedagógico: Projeto: Projeção da intencionalidade educativa para futura operacionalização; Político: Define uma posição de grupo, uma proposta coletiva, consciente, fundamentada e contextualizada para a formação do cidadão; Pedagógico: define a intencionalidade formativa e expressa uma postura de intervenção formativa (Cf. EYGE apud FERREIRA, 2008, 82).
[6] Acredita-se que este termo seja mais rico para utilização nesse contexto. O termo transformar se refere a modificação dos acidentes da coisa, já o termo transubstanciar se refere a modificar a substância e não dos acidentes.

terça-feira, 15 de maio de 2012

Uma breve Relação entre Filosofia e Psicologia



Existe uma forte relação entre a Filosofia e a Psicologia, podendo-se afirmar que são as ciências humanas mais próximas[1]. Os primeiros estudos sobre o psiquismo e a alma foram realizados pela Filosofia Grega, a qual observava atentamente as atividades humanas e a manifestação da alma[2]. Sendo assim, pretende-se aqui fazer uma breve análise da relação de proximidade entre a Filosofia e Psicologia, salientando: a grande afinidade que existe entre o pensamento filosófico e a Psicologia; o aprofundamento da antropologia filosófica, principalmente do psiquismo, dimensão constitutiva do ser humano; e, por fim, o autoconhecimento, que propiciará um encontro da verdade e bem que habita no interior humano.
A própria etimologia da palavra Psicologia pode ressaltar o desejo que tanto a Filosofia quanto a Psicologia tem, a saber: conhecer “O que é homem” [3]. O termo ψυχή (psyché) significa pessoa, alma humana, sentimento, caráter[4] e λόγος (lógos) significa matéria de estudo e conversação, relato, notícia[5]. Sendo assim, a Psicologia busca estudar a pessoa humana, principalmente sua dimensão interior.  Do mesmo modo que o pensamento filosófico: “No campo filosófico, a interrogação sobre o homem torna-se o tema dominante na época da sofística antiga (séc. V a. C.) e, a partir de então, acompanha todo o desenvolvimento histórico da Filosofia Ocidental...”[6]
Sendo assim, expressa-se uma primeira relação entre o estudo da psicologia e o pensamento filosófico, pois aquela está em estreita relação com este, possibilitando-se assim um diálogo e um aprofundamento de temas caros à Filosofia que a psicologia poderia iluminar e/ou até mesmo responder e dar soluções.
Já nesta segunda relação faz mister lembrar do  pensador Immanuel Kant, filósofo moderno do século XVIII, que elaborou uma crítica à Filosofia e consagrou seu pensamento como a “filosofia da filosofia”[7] . Kant ressalta na obra Crítica da Razão Pura que todo interesse de seu pensamento está nas questões:
Que posso saber?
Que devo fazer?
Que posso esperar?[8]

Estas perguntas são, na obra Lógica, unificadas em uma só (que está ausente na Crítica da Razão Pura): “o que é o homem?”. Kant salienta que a Filosofia é, impreterivelmente, uma forma de antropologia[9]. Ao que se percebe, a partir do pensamento Kantiano, a questão sobre o ser humano se torna central em toda reflexão filosófica[10], ou seja, o ápice de todo discurso filosófico se dará na antropologia.

Assim sendo, os estudos da Filosofia moderna e pós-moderna se voltam com insistência para elaborar o melhor discurso possível sobre o ser humano[11], buscando levar em consideração suas categorias de estrutura, relação e unidade. Na categoria de estrutura ou níveis ontológicos constitutivos, o ser humano é composto de corpo próprio, psiquismo e espírito (dimensão espiritual, chamada por alguns autores também de mente)[12]. Na categoria de estrutura percebe-se a importância e influência da dimensão psíquica, porque é graças a ela que poderá acontecer a ligação entre as outras duas dimensões: “Desde o início, pois, de nossa reflexão sobre o psiquismo ele aparece como situado numa posição mediadora entre o corporal e o espiritual.” [13] Além disso, o psiquismo é responsável por interiorizar as experiências vividas pela dimensão corporal e exteriorizar o mundo interior do sujeito humano:

“A passagem do estar-no-mundo para o ser-no-mundo, ou da presença natural para a presença intencional, dá-se aqui no sentido de uma interiorização do mundo ou da constituição de um mundo interior. Pelo ‘corpo próprio’ o homem se exterioriza ou constitui sua expressão ou figura interior, e o Eu corporal é como que absorvido nessa exteriorização. Pelo psiquismo o homem plasma sua exteriorização ou figura interior, de modo que se possa falar com propriedade do Eu psíquico ou psicológico.”[14]
Portanto, o estudo da dimensão psíquica é fundamental para uma lapidação dos estudos antropológicos filosóficos, pois o psiquismo faz acontecer o encontro da unidade entre os pólos da dimensão humana e ainda aprofundar as expressões interiores do homem. No estudo do psiquismo humano poder-se-á entrar mais profundamente no estudo da dimensão que consegue trazer unidade na constituição ontológica humana e ainda é responsável por fazer com que o ser humano saia de um solipsismo espiritual para uma abertura ao mundo real e empírico.
Por fim, apresenta-se esta terceira relação, fazendo-se mensão ao o pensamento de Agostinho de Hipona, o qual acredita que o ser humano tem pela Razão (inteligência-razão) uma abertura para a Verdade e pela Vontade uma abertura para o Bem, conforme afirma Sciacca sobre o Agostinho: “Todas as operações do espírito provenientes do espírito mesmo por meio da inteligência-razão, que alcança a Verdade, e da vontade, que adere ao Bem.”[15] Sendo assim, a dimensão interior do ser humano busca a verdade e o bem, pois todos os homens estão abertos a esse encontro.
O ser humano, deste modo, vai a uma busca constante por essa verdade e esse bem que possa dar sentido a sua existência e manter-lhe em constante descoberta e desvendamento do mundo interior e exterior. Quanto maior seu afastamento de si mesmo menor será sua possibilidade de encontrar essa Verdade e Bem que tanto busca. O ser humano deve, então, partir em busca dessa verdade no mais íntimo de si mesmo, pois poderá encontrar nessa relação consigo mesmo o seu sentido: “Não saias de ti, mas volta para dentro de ti mesmo, a verdade habita no coração do homem”[16].
Ora, sendo a psicologia o estudo do ser humano, com atenção para a interioridade humana, vez-se como terceira relação o autoconhecimento pessoal, visto que é necessário, conforme afirmado acima, o homem se conhecer para encontrar a verdade e o bem, consequentemente o sentido da existência humana. A psicologia poderá propiciar um maior contato com a dimensão interior humana e, assim, a uma aproximação do “eu” que habita no “coração humano”.
Deste modo, pode-se concluir que a Filosofia e a Psicologia tem uma estreita relação e necessitam estar constantemente sendo estudadas para um melhor aproveitamento da Antropologia. Além disso, ambos os estudos podem propiciar ao homem um maior autoconhecimento de si e melhorar as relações intersubjetivas. Ressalta-se que este estudo não pretendeu apontar todos os pontos de relação entre a Filosofia e Psicologia, mas foram apontados aspectos que se acredita serem alguns dos principais.

Referências Bibliográficas:

·         AGOSTINHO, Santo. A verdadeira Religião. Trad. Nair de Assis Oliveira. 2.ed. São Paulo: Paulus, 1987. [abreviatura: AGOSTINHO, 1987, ...]

·         DEKENS, Olivier. Compreender Kant.Trad. Paula Silva. São Paulo: Loyola, 2008. [abreviatura: DEKENS, 2008, p. ]

·         DORIN, Lannoy. Enciclopédia de Psicologia Contemporânea: Psicologia geral. São Paulo: Livraria Editora Iracema Ltda, 1980. v. 1. [abreviatura: DORIN, 1980, p. ]

·         MELENDO, Tomás. Iniciação à Filosofia: Razão, fé e verdade. Trad. Marciano Lang Fraga. São Paulo: Instituto Brasileiro de Filosofia e Ciência “Raimundo Lúcio” (Ramon LLuLL), 2005. [abreviatura: MELENDO, 2005, p.]

·     KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura. Trad. Valerio Rohder e Udo Baldur Moosburger. São Paulo: Nova Cutural Ltda, 1999. [abreviatura: KANT, 1999, p.]

·        PEREIRA, Isídio, S.J.. Dicionário grego-português e portguês-grego. 5. ed. Porto: Livaria Apostolado da Imprensa, 1976. [abreviatura: PEREIRA, 1976, p. ]

·        SCIACCA, M. F. San Agustín. Trad.  P. Ulpiano Álvarez Díes, O. S. A. Barcelona: Luis Miracle, editor, 1995. [abreviatura: SCIACCA, 1995, p. ]

·        VAZ, H. Cláudio de Lima. Antropologia Filosófica. 10. ed. São Paulo: Loyola, 2010. [abreviatura: VAZ, 2010, p. ]


[1]Cf.  VAZ, 2010, p. 171
[2] Pode-se citar alguns exemplos: Sócrates pensava, baseado no oráculo de Delfos, que para se conhecer o comportamento das outras pessoas era necessário conhecer-se a si próprio: “conhece-te a ti mesmo”; já Platão preocupa-se mais com o problema das origens das ideias; Aristóteles é o primeiro a se aventurar nas investigações mais seguras sobre a consciência e a conduta do homem (Cf. DORIN, 1980, p. 6 e 7)
[3] Cf. VAZ, 2010, p. 3
[4] Cf. PEREIRA, 1976, p. 638.
[5] Cf. PEREIRA, 1976, p. 350.
[6] VAZ, 2010, p. 3
[7] DEKENS, 2008, p. 10
[8] KANT, 1999, p. 478
[9] Cf. DEKENS, 2008, p. 18. Antropologia significa em sua etimologia o estudo do ser humano (ἂνθρωπος [ánthropos] significa em grego homem, mulher Cf. PEREIRA, 1976, p. 51). Existe uma diferença entre a antropologia e a psicologia, visto que a Antropologia tem como objetivo construir um discurso sobre o homem-objeto (epsitemologicamente), formalmente considerado como sujeito (ontologicamente) Cf. VAZ, 2010, p. 3, já a psicologia é uma ciência que busca compreender o ser humano a partir de seus comportamentos e condutas em seu meio Cf. VAZ, 2010, 172.
[10] Na nota 6 da primeira justificativa afirma-se com Lima Vaz, que o questionamento sobre o homem é um tema que na antiguidade se tornou constante, porém não essencial. Na antiguidade, a questão central está em torno do discurso sobre o absoluto, ou seja, metafísico. A partir da modernidade o discurso se centra nas questões antropológicas, conforme ressaltado.
[11] Cf. MELENDO, 2005, p. 65.
[12] Cf. VAZ, 2010, p. 154. Não se vê necessidade de citar no texto as divisões das categorias de relação (objetividade, inter-subjetividade e transcendência) e de unidade (realização e essência ou pessoa), visto que não  seestá fazendo um estudo aprofundado do tema e do autor, mas sim levando em consideração a importância de suas observações acerca do pensamento sobre o homem.
[13] Ibidem, p. 168.
[14] VAZ, 2010, p. 169.
[15] SCIACCA,1955, p.427. “Todas las operaciones del espíritu provienen del espíritu mismo por medio de la inteligencia-razón, que alcanza la verdad, y de la voluntad, que se adhiere al bein.”

segunda-feira, 14 de maio de 2012

O problema da Linguagem (homo Loquens)



O homem é freqüentemente definido como homo loquens, pois a propriedade da linguagem distingue-o nitidamente dos seres e  faz dele um ser totalmente singular. A linguagem se tornou o assunto principal das atuais investigações, pois o pensamento atual assumiu uma forte direção lingüística. A reviravolta nas investigações filosóficas foi operada recentemente por alguns filósofos (a partir de Moore, Wittgenstein, Russell r s escola de Viena) que pensaram que os problemas filosóficos são problemas lingüísticos. Graças a esta orientação lingüística leva-se a uma revelação do aspecto lingüístico do ser humano e um aprofundamento do homo loquens.
1.      História da filosofia da linguagem
           Os estudos lingüísticos tiveram seu início já nos tempos dos pré-socráticos os quais formularam as duas principais questões:
a)      A questão da origem da linguagem;
b)      A questão da natureza da linguagem;
            Alguns dos pré-socráticos acreditavam que a linguagem derivava diretamente da natureza ou mesmo da divindade e a concebiam como espelho direto e imediato das coisas. Os sofistas consideravam-na convencional, tanto sua origem como sua função.
            Aristóteles concebe a linguagem como instrumento do pensamento e também que ela tinha uma função de representar as coisas, mas dependendo da decisão do homem. A linguagem, era para ele, natural em sua função, mas convencional na sua origem.
            Plotino, por sua vez, acreditava que a linguagem se subtrai completamente a qualquer designação humana. É absolutamente inefável.
            Já Santo Agostinho estuda a relação da linguagem com as coisas e a subordina antes de tudo as coisas, mas definitivamente ao Verbo divino.
Os escolásticos estudavam sobretudo a problemática dos signos, distinguindo-os entre naturais e artificiais, também se ocupa, com a linguagem literal, analógica e simbólica.
O período romântico marca o renascimento dos estudos filológico e a filosofia da linguagem volta-se a questão da origem da linguagem e ao problema da relação entre linguagem e cultura.
Na contemporaneidade a linguagem tem sua ascensão e é tomada de muitos ângulos: semântico, gnosiológico, ontológico, social e psicanalítico.
2.      Importância da linguagem
            Não há nenhum aspecto da realidade e nenhum problema filosófico que não se ache possível resolver abordando-o do ponto de vista lingüístico. Huxley acredita que a linguagem faz o homem ser o que ele é. A linguagem, para ele, dá capacidade ao homem de registrar suas experiências para posteriores gerações e ainda o permite apreender, em sentido obscuro, o mecanismo do universo.
            Cassirer acredita que a linguagem é um dos meios fundamentais do espírito, graças ao qual passamos do mundo da sensação para o mundo da visão e da representação. Ela compreende já no início o trabalho intelectual, que será exprimido na formação dos conceitos e como unidade lógica da forma.
            Gusdorf diz que a linguagem é a primeira grande invenção do homem, que contém em estado embrionário todas as outras; a linguagem é a mais original das técnicas.
            Polanyi afirma que a superioridade intelectiva do homem deve-se que exclusivamente ao uso da linguagem. Heidegger, por sua vez, chama a atenção para a importância metafísica da linguagem. Ela constitui a primeira e mais importante epifania de Ser. Para Heidegger, a linguagem faz do homem o ser vivente que é enquanto homem.
3.      Definições e divisão da linguagem
            Como primeira tentativa de definição pode-se dizer que é um sistema de signos que torna possível a comunicação entre os homens, conforme Lalande propõe como definição geral da mesma. Os signos são entendidos como algo que existe por outra coisa diferente, que indica algo diverso em si mesmo (ex.: fumaça- fogo). É da essência do signo o ter caráter intencional: atrai a atenção sobre a coisa que é signo. Temos três espécies de signos existentes:
a)      Naturais e artificiais;
b)      Lingüísticos e não-lingüísticos;
c)      Icônicos e convencionais;
           A linguagem é um sistema de signos artificiais e convencionais destinados à comunicação, ela quer significar intenções idéias, sentimentos, coisas etc. Ela é um instrumento ideal da intencionalidade essencial do homem, é uma abertura que possibilita a comunicação e esta se efetua principalmente mediante a linguagem.
           É de suma importância que façamos três distinções nas discussões sobre a linguagem:
Linguagem: usa-se em oposição a língua, para distinguir a função de se exprimir, em geral com as palavras, dos vários sistemas lingüísticos fixos em uma sociedade determinada;
Língua: é um sistema supra-individual de signos, graças aos quais o homem pode comunicar entre si. É diferente de fala, a qual é a forma concreta e individual assumida do sistema, segundo o uso de determinada pessoa, segundo os significados pessoais, subjetivos e emotivos por ela desejados.
Significado e significante:
·         Significante quer dizer uma realidade como é denotada e estruturada pela linguagem;
·         Significado: indica o modo sempre parcial e histórico em que a língua falada atualiza o significante; o significado representa a atualização desse significante em um determinado discurso e em uma cultura determinada;
4.      Origem da Linguagem
            Existem duas concepções sobre a origem da linguagem:
a)      Linguagem é recebida (Deus ou Natureza);
b)      Foi inventada pela homem (imitando a natureza ou artificialmente);
            Ambas foram acolhidas por pensadores tanto na antiguidade quanto nos tempos presentes. A primeira, atualmente, é pouco acolhida, porém antigamente foi muito acolhida; segundo Humboldt, a linguagem tenha sido colocada no homem, pois é mediante ela que o homem é homem.
            Porém, contemporaneamente, a tese mais comum é que a linguagem é fruto da evolução, mas há modos diferentes de interpretar, a saber:
a)      Onomatopéia: acreditavam que a linguagem nasce pela imitação que o homem faz dos sons da natureza;
b)      Convenção: o homo sapiens imita certos sons para cumprir determinadas operações;
Obs.: essas duas teses podem integrar-se mutuamente;
5.      Condições transcendentais da linguagem
            A linguagem pressupõe 3 condições transcendentais, 3 constantes ou componentes absolutos:
·         Sujeito que fala;
·         Objeto de que se fala;
·         Interlocutor a que se fala e com quem se quer comunicar;
            Se falta um desses componentes a linguagem já não pode ter lugar, para Macquarrie a linguagem é um complexo de relações fecundas, sobre esses três termos citados.
6.      Função e valor da Linguagem
            Até alguns anos atrás se costumava apresentar uma divisão dicotômica das funções da linguagem:
·         Função descritiva, ou cognitiva, ou denotativa, ou representativa, ou simbólica;
·         Função emotiva, performativa, existencial ou pessoal;
            Ultimamente, porém, tornaram-se mais freqüentes os autores que acreditam na linguagem com uma divisão tricotômica. Chega-se a acreditar que esta divisão seja mais justificada que a primeira, pelo fato de ela resultar dos três componentes essenciais constitutivos da linguagem:
a)      Função representativa ou descritiva nos confrontos do objeto;
b)      Função expressiva ou existencial ou emotiva nos confrontos do sujeito;
c)      Função comunicativa ou intersubjetiva nos confrontos da pessoa que se dirige o discurso;
a) Função descritiva
            A corrente neopositiva e analítica dá valor absoluto à função denotativa e condena como insignificantes e carentes de sentido as outras funções. Somente pela função denotativa o homem está habilitado a alcançar e a transmitir a verdade. Existem críticas a essa teoria dos neopositivistas, das quais são as principais:
I)                   O critério de verificação experimental é um postulado metafísico privado der qualquer fundamento, é uma proposição metafísica sensorial, que se desqualifica sozinha porque é invencível;
II)                 A preferência pela linguagem cientifica é de todo injustificada, porque há muitas outras linguagens que para a existência humana são tão importantes quanto a científica (por ex.: a linguagem ordinária, ética, artística, poética e a mística);
III)              A preferência pela função descritiva ou cognitiva da linguagem é a conseqüência de  uma tradição intelectualista e racionalista que foi extremamente danosa, porque criou uma imagem deformada e empobrecida do homem;
Reconhecida a insustentabilidade do critério de verificação experimental, alguns epsitemólogos propuseram como critério a falsificabilidade: são científicas apenas os dotados de falsificabilidade.  Porém, o critério de falsificabilidade não pode dizer outra coisa que não isso: não é de fato cientifico aquilo que foi demonstrado ser falso.

b) Função comunicativa
             A função principal da linguagem humana é de fato a comunicação e comunicativa. Em muitos casos não se pretende descrever somente objetivos, coisas, fenômenos, etc., mas afetos, sentimentos etc. Barbotin põe em evidência o valor comunicativo, existencial, prático da linguagem, a qual é instrumento privilegiado da comunicação e também da presença da sociabilidade.
            A função fundamental da linguagem é, pois, a da comunicação, todavia, deve-se constatar que é uma comunicação que a linguagem não consente nunca realizar plenamente, pois ela tem aspetos ambíguos (formação – deformação).
c) Função e valor existencial
            A linguagem é importante não apenas pela função descritiva e comunicativa, mas também pela função existencial. Ela serve também para testemunhar nos outros a  si próprio a existência. Não se trata de um testemunho vago, indeterminado, genérico, mas determinado, preciso e qualificado. A palavra adquire densidade essencial sobretudo através do nome, ter um nome significa possuir existência.
d)      Função ontológica
            Heidegger chama a atenção dos estudiosos sobre outra função capital da linguagem, a do confronto com o ser. A natureza propriamente da linguagem é de dizer enquanto mostrar. A linguagem original tem uma força que funda o próprio ser das coisas, poder-se-ia dizer uma força criativa.
            Heidegger atribui à linguagem originária uma densidade ontológica fundamental: a palavra não é somente habilitação e signo, mas também fonte e sustentáculo do ser das coisas. Porém, não é a palavra que produz o ser das coisas, mas ela é como uma relação (“relação fundamental”, “relação de todas as coisas”), uma espécie de lei suprema. Para Heidegger, a palavra diz o ser.
            Da linguagem originária que é essencialmente  dizer tem-se a origem da linguagem humana, que antes de dizer é essencialmente um escutar e pode tornar-se  dizer somente depois de ser já um escutar. O dizer originário, ou seja, a palavra dotada daquela densidade ontológica-fundamental a que se refere é o mito. Para Heidegger e muitos outros, o mito é uma expressão mais direta, imediata e original e, portanto, também mais autêntica da realidade.
7.      Relação da linguagem com o pensamento, com as coisas e com os interlocutores
           Passa-se agora a considerar o problema da linguagem de outro ponto de vista: o das suas relações com o pensamento, com as coisas e com os interlocutores.
           Com relação ao pensamento-linguagem a solução comum é ver a linguagem como um instrumento subordinado e secundário do pensamento. Os estruturalistas e hermeneutas tendem a subverter essa relação e a pôr o pensamento ao serviço e à dependência da linguagem.
           Para o que concerne a linguagem e ser há duas tendências opostas:
a)      Geralmente se reconhece na linguagem valor semântico, indicativo, assinalado do ser;
b)      O ser acha sua epifania na linguagem, sobretudo o ser do homem tem a sua sustentação, o seu modo de linguagem;
            Quanto a relação linguagem-interlocutor existem duas teses opostas:
a)      O valor essencial da linguagem para a intersubjetividade;
b)       Atribuir pequeno valor intersubjetivo a linguagem, porque parte de uma concepção egocêntrica, angélica do homem;
            A linguagem tem importância capital pela função intersubjetiva que desenvolve, a qual provém da função comunicativa da linguagem e ter caráter mais prático do que descritivo. Além disso, traz consigo, em cada caso forte dose de elementos pessoais (subjetivos, emotivos).


8.      Implicações onto-antropológicas da linguagem
O estudo da linguagem revelou muitas coisas sobre o ser do homem, delas pode-se destacar três:
I.                    A linguagem distingue o homem, de modo nítido, dos animais, colocando em evidência a sua superioridade intelectual;
II.                 A linguagem revela a natureza completa do ser do homem, revelando claramente como nenhum outro fenômeno a interação e a interdependência do físico e do conceptual na existência humana;
III.               A linguagem desvela nos confrontos com a realidade a tensão do homem ao suplantar-se continuamente, a auto-transcender-se e a transcender tudo o que disse e é capaz de dizer.



Referências bibliográficas:
·         MONDIN, Battista. O homem quem é ele? Elementos de antropologia filosófica. 4.ed. São Paulo: Paulinas, 1980. p. 132- 152.